Qual o prazo para exigir a reparação de direitos trabalhistas violados?

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Qual o prazo para exigir a reparação de direitos trabalhistas violados?

O COTIDIANO E OS PRAZOS

É dito popular que os advogados vivem de prazos.

Há realmente uma grande verdade nisso.

Só que parando para refletir, quem é que não tem suas atividades pautadas por um tempo determinado para cumpri-las?

Tire uns minutos e reflita sobre as atividades do seu dia a dia.

Percebeu como todas estão envolvidas por um prazo?

Tudo que você faz, profissionalmente ou na vida privada, está limitado pelo tempo (que chamamos de prazo).

Aliás, desde a mais tenra infância aprendemos a lidar com esse “período de tempo determinado para realizar alguma coisa”.

Era assim com as tarefas da escola, provas, apresentações de trabalhos escolares, férias, horário para refeições, hora para estar em casa depois de brincar na rua, até mesmo a duração do banho era controlada pelos pais.

Logo, de maneira quase que instintiva, aprendemos o que é um prazo e que o seu transcurso acarretará alguma consequência, boa ou ruim.

No âmbito jurídico, o transcurso do tempo pode gerar direitos (ex.: usucapião) ou pode extingui-los.

 O que pretendemos compreender a partir deste texto é a influência do prazo para a extinção da pretensão jurídica, ou do próprio direito, no âmbito do Direito Trabalhista.

Além disso, por ser direcionado a diferentes tipos de públicos, não nos aprofundaremos em questões processuais ou debates doutrinários, o que tornará o entendimento mais acessível.

Portanto, trataremos especificamente sobre dois institutos jurídicos importantes: a prescrição e a decadência.

 

O QUE SÃO A PRESCRIÇÃO E A DECADÊNCIA

Para começar, e como já dito ser o propósito deste texto, é preciso estabelecer que, tanto a prescrição, quanto a decadência, extinguirão direitos.

Quanto a isso não restam dúvidas!

O que importa, a partir desse ponto, é entendermos sobre que tipos de direitos estamos falando para cada um destes institutos.

Afinal de contas, apesar da haver afinidade entre eles, o legislador estabeleceu que cada um incidirá sobre tipos de direitos diferentes.

Vejamos, então, sobre a prescrição em primeiro lugar.

O artigo 189 do Código Civil conceitua prescrição da seguinte maneira:

Art. 189. Violado o direito, nasce para o titular a pretensão, a qual se extingue, pela prescrição, nos prazos a que aludem os arts. 205 e 206.

Tranquilo, não é?

Traduzindo (rs...) para tornar entendível, a prescrição é a extinção da pretensão de um direito material violado, ou ainda, é o tempo que se pode acionar o judiciário para resolver um conflito de interesses.

A pergunta que deve ter ficado agora é: o que é pretensão?

Pois não vamos deixar nada sem explicação.

Pretensão é o poder que uma pessoa tem de exigir, juridicamente, que um terceiro realize uma ação ou se omita.

Para entender como isso funciona, vamos pensar no seguinte cenário:

Tício comprou um carro de Caio. Os dois acertaram que o pagamento seria feito em 2 parcelas. A primeira no fechamento do contrato e a segunda em até 60 dias (aqui temos o prazo para cumprir uma obrigação, que não se confunde com o prazo para prescrição!). Com o pagamento da primeira parcela, Tício já tomou posse do automóvel.

A partir desse contexto, é direito material de Caio receber a segunda parcela do pagamento, dentro do prazo de 60 dias, enquanto surge a obrigação de Tício de fazê-lo.

Aqui fique atento ao seguinte: o prazo para pagamento da segunda parcela não se confunde com o prazo prescricional!  

Seguindo então.

Se Tício fizer o pagamento dentro dos 60 dias, encerra-se o negócio com as duas partes tendo cumprido suas obrigações contratuais e legais.

No entanto, caso Tício não pague a segunda parcela no tempo acordado entre ambos, a partir do 61º dia nasce para Caio a pretensão, já que seu direito material (que é receber o pagamento da segunda parcela) foi violado.

Isto quer dizer que ele poderá acionar Tício na justiça para que o juiz o condene a cumprir com sua obrigação.

Agora chegamos à pergunta que vale 1 Milhão:

Caio poderá exercer essa pretensão quando ele quiser? Mesmo daqui a 15 anos?

A resposta é: NÃO!

Caio tem um prazo para cobrar essa dívida judicialmente. A este chamamos de prazo prescricional.

Transcorrido o prazo prescricional, extingue-se a pretensão. Ou seja, Caio não poderá mais acionar o judiciário para cobrar Tício.

O prazo prescricional é variável e está previsto em diversas legislações, a depender do tipo de relação jurídica existe entre as partes. No exemplo que utilizamos, o prazo seria de 5 anos para Caio exercer sua pretensão.

Portanto, a prescrição extingue o direito de pretensão, mas não extingue a obrigação.

A extinção de uma obrigação se dá pela decadência.

Nas palavras da professora e Desembargadora do Trabalho do Rio de Janeiro, VÓLIA BONFIM[1]:

“Enquanto a prescrição torna inexigível uma pretensão, a decadência atinge o próprio direito. Na prescrição o direito persiste, mas a pretensão é liquidada.”

A decadência é bem menos frequente que a prescrição, além de bem mais fácil sua compreensão.

Transcorrido o prazo decadencial extingue-se o próprio direito.

Vamos usar o caso exemplo que estávamos vendo e considerar (de maneira bem surreal e simplista) que, se não for paga a dívida em 60 dias, ela simplesmente deixa de existir.

Basicamente é isso que acontece com a decadência. Caio tinha direito de receber a segunda parcela em até 60 dias. Passado esse tempo, a dívida não existe mais e Caio nada mais pode cobrar de Tício.

 

A PRESCRIÇÃO E DECADÊNCIA NO DIREITO TRABALHISTA

Chegamos ao ponto onde podemos responder à pergunta título deste texto.

Percorremos um caminho com explicações de conceitos necessários para que se entenda a resposta que veremos a seguir.

Também precisamos estar cientes de que será abordado apenas o prazo prescricional básico, sem aprofundar em questões de suspensão, interrupção e intercorrência, que poderão influenciar na contagem do tempo.

A resposta básica já permite que todos possamos exercer nossos direitos trabalhistas e exigir o seu cumprimento por terceiros.

Então, afinal, qual é o prazo para o exercício dos direitos trabalhistas?

Diz o artigo 7º, inciso XXIX da Constituição Federal:

Art. 7º São direitos dos trabalhadores urbanos e rurais, além de outros que visem à melhoria de sua condição social:

XXIX - ação, quanto aos créditos resultantes das relações de trabalho, com prazo prescricional de cinco anos para os trabalhadores urbanos e rurais, até o limite de dois anos após a extinção do contrato de trabalho;

O mesmo texto é reproduzido no artigo 11 da Consolidação das Leis Trabalhistas (CLT).

Pela leitura do dispositivo legal, então, e com o entendimento do que seja prescrição, fica tranquilo entender que o prazo prescricional é de 5 (cinco) anos enquanto vigente o contrato de trabalho e, caso encerrado este contrato, o prazo será de 2 (dois) anos.

Então temos o seguinte:

  • Contrato vigente: 5 anos;
  • Contrato encerrado: 2 anos;

Mas atenção!

Esses prazos de 5 (cinco) e 2 (dois) anos devem ser conjugados.

Vejamos como isso funciona na prática:

Empregado que trabalha em uma empresa há 9 anos, tem seu contrato rescindido pela empresa que não paga as verbas rescisórias devidas. Neste caso, o empregado tem o prazo de 2 (dois) anos para promover ação trabalhista e cobrar da empresa o pagamento das verbas rescisórias.

Tranquilo, certo?

Eu chamei atenção para a conjugação dos prazos, pois esses 2 (anos) após o encerramento do contrato de trabalho, podem retroagir até 3 (anos) anos antes da rescisão.

Lembra que o prazo prescricional é de 5 (cinco) anos?

Esse prazo de 5 (cinco) anos é a chamado prescrição total.

Enquanto o prazo de 2 (anos) é chamado de prescrição extintiva.

Logo, se o empregado demitido promover ação judicial no dia seguinte à rescisão, poderá “buscar” direitos trabalhistas lesados 5 (cinco) anos atrás.

Entretanto, se deixar para promover a ação judicial no 2º ano após a rescisão, só poderá buscar os 3 (três) anos antecedentes à rescisão (2+3=5).

Novamente contando com o magistério da Desembargadora VÓLIA BONFIM[2]:

Extinto o ajuste trabalhista o empregado terá o prazo de dois anos para ajuizar a ação trabalhista que vise à reparação de qualquer lesão ocorrida na vigência do contrato. Transcorrido o prazo, sem que a parte tenha exercido seu direito, a pretensão está prescrita.”

Algumas vezes, o que acontece, é que o empregado trabalha há anos na empresa e “deixa passar” algumas faltas cometidas por esta durante a relação de trabalho. Então, quando demitido, decide que vai, nesse momento, cobrar judicialmente aquela falta cometida pela empresa (por exemplo, o não pagamento de férias).

Ocorre que, não sabendo sobre o instituto jurídico da prescrição, ele acaba por perder o direito de exigir aquele crédito trabalhista, visto que ocorreu 10 (dez) anos antes da rescisão, ou seja, já está prescrito seu direito.

Antes de concluir, vale relembrar que o prazo prescricional inicia sua contagem a partir do momento que o direito material foi violado.

Logo, se a lei determina que as férias devem ser concedidas nos 12 meses subsequentes à data em que o empregado tiver adquirido o direito (art. 134, CLT), a partir do 13º mês inicia-se a contagem do prazo prescricional para exigir o pagamento em dobro (art. 137, CLT), que será, obviamente, de 5 anos.

Portanto, entender estes prazos é extremamente importante para o exercício de direitos trabalhistas no tempo certo, sob pena de vê-los prescreverem e se tornarem inexigíveis.

Espero ter atingido o objetivo de explicar, de maneira entendível, esses institutos jurídicos super importantes para todos.

Você acha que esse conteúdo é relevante? Deixe o seu comentário, esclareça suas dúvidas e compartilhe!

 

[1] Direito do Trabalho: de acordo com a reforma trabalhista, 16ª ed., rev. e atual., 2018. p.1217

[2] Op. Cit. p.1220



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